quinta-feira, 10 de julho de 2008

O Meu Segredo- Crônica

Segredos, segredos, segredos.
Muitos segredos.
Alguns bem trancados,
Outros, apenas velados.
Mas há sempre um momento,
Improviso e fugaz,
Num “abri-te sésamo”
Vão soltos no ar.

Existe um desenho de Salvador Dali, que ele chamou “figura com gavetas”. Representa uma mulher, alta, esguia, cabelos ao vento, cuja nudez abriga dezenas de gavetinhas, algumas fechadas, outras semi-abertas. Foi esta mulher que inspirou os versos acima, quando o desenho foi distribuído durante uma oficina de poesia, na Casa das Rosas, para que os alunos criassem, na classe, um poema. Foi como se Dali estivesse me dizendo: “as pessoas escondem mil segredos, mas eu consigo vê-los porque elas, no fundo, querem que eu o faça”.
Todos acabam soltando seus segredos no ar, mais dias, menos dias; ninguém é,– como muitos dizem – um livro aberto. Eu também não. Durante minha vida toda andei desfraldando meus segredos, aos poucos. Frequentemente tive orgulho deles e de tê-los compartilhado com outros seres humanos nos momentos em que eu precisei fazê-lo ou em momentos em que eles necessitaram ouvir uma confidência.
Mas sempre fica algo, escondido, lá atrás, no fundo de passados já vagos, de lembranças cálidas, de desejos realizados, até de projetos sem futuro. Tenho sim, um segredo: pensar nele tem o gosto de um madrigal, como se sua simples presença criasse música e ela fizesse com que, de repente, eu conseguisse cantar sem desafinar.
É o tipo de segredo cuja gavetinha não abro sempre, mas quando quero acalentá-lo, basta um toque de dedo na minúscula fresta corrediça, para que eu fique inebriada pela sensação egoísta de que ele ainda está aí, vivo, dentro de mim. Como agora, neste momento: ele está chegando à minha mente, e, devagar, desce pela canície até a nuca, num caminho discreto, por traz das orelhas, tropeçando nos brincos, em direção aos lábios, agora solto no ar. Único, talvez o último, eis aqui meu pequeno grande segredo: ainda tenho um segredo.

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