quinta-feira, 10 de julho de 2008

Árvore Genealógica - Crônica

A minha foi transplantada.
E não pegou. Já no Brasil, meus pais se separaram, eu era ainda uma criança (nos anos cinquenta, aos quinze anos se era criança), ninguém acompanhou mais a vida de ninguém: nem daqui nem de lá.
Sobrou minha irmã, com seus dois filhos e netos para formar a sua árvore genealógica. E eu: comecei a criar minhas próprias raízes, novas, um tanto híbridas: minha única filha, brasileira, produto desta italiana com um produto franco-sueco-alemão, hoje tem quarenta e sete anos, três casamentos e nenhum filho.
Da minha árvore genealógica só sei com certeza que – até l950 - não havia nenhum ladrão, assassino, ou presidiário por qualquer razão que fosse. Minto, meu pai foi preso por 72 horas por não ter comparecido, como mesário indicado pela prefeitura, e esta era a lei, às eleições de l948. Ele já estava tão farto de guerra, política e politicagem, que desistiu até do dever cívico.
Dos meus quatro avos, só sei que o meu avô por parte de pai era rico e bonvivant, gostava de um poquer e morreu numa mesa, ganhando. Convivi com minha avô paterna durante uma estadia de aproximadamente uma semana e lembro perfeitamente dela, a vovó que eu esperava: risonha mas rabugenta, cabelo esticado na nuca num chignon caprichado, beijava pouco e cheirava aos temperos daquele maravilhoso pão de mel apimentado.... Poucos dias depois de tê-la deixado e voltado para minha casa em outra cidade, ela se foi, espero que sem perceber, junto com algumas filhas e alguns netos. Era tempo de guerra e os civis sempre pagam com a vida o ódio de poucos, quase sempre fardados...
Minha avó materna morreu quando minha mãe era ainda criança e a conheci por fotografia; meu avô era pintor, e sei disto porque os dois filhos, minha mãe e seu irmão, herdaram alguns quadros e um retrato em foto. Retrato que transformou-se num “segredo de família”, cujo texto enriqueceu – assim espero – a oficina de “segredos” orquestrada por Karen, em Maio do ano passado, mas serviria para a oficina atual, portanto ainda disponível.
Assim, como estamos vendo, minha árvore genealógica é – mais uma vez – minha memória. O que eu plantei é pouco, mas tentei dar-lhe a melhor qualidade, sem dever nada a famosos sobrenomes de pedegree herdados, para me gabar. Aliás, um velho amigo meu dizia que
“quem se gaba de seus antepassados, confessa pertencer
a uma família que é melhor morta do que viva.....”
pois cada um deve ostentar só aquilo que conseguiu construir, pessoalmente.
Tenho orgulho do pouco, mas legitimamente meu, que fiz até agora. Portanto, como um poeta escreveu em sua ode na morte de Napoleão: “aos pósteros a árdua sentença”...*

* “Il 5 Maggio”, ( 5.05.1821) A. Manzoni (1785-1873)

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