quinta-feira, 23 de janeiro de 2014

RESENHA DE FILME --- A GRANDE BELEZA

Título original:     La grande Bellezza
Produção:          Italia/França 2013
Direção:             Paolo Sorrentino
Cast:                  Toni Servillo et alia

A suntuosidade de Roma foi só pretexto para o filme e seu título. É bem verdade que a fotografia que enquadra a cidade e suas preciosidades, contribuiu para, de alguma forma, distrair – e abstrair – a platéia que, como muitos dos personagens, acabam concordando que naquele cenário, tudo é admissível, compreensível, perdoável. Entretanto paira no filme uma contundente e bem fundada crítica à nossa vida atual, não importa em que cidade, em que país, em que tipo de “nobres” circulamos.
Se o protagonista da história, continua há anos se beneficiando das benesses que lhes são oferecidas pela fama de ser autor famoso - de um livro só - há dezenas de outras pessoas que extraem benesses da fama dele. Numa cidade onde circulam nobres decaídos e não, gente bonita, famosos internacionais, escroques e “arrivistas”, a vida corre inconclusivamente dia e noite, e escorre entre os dedos dos “eleitos” enquanto gente normal – que não aparece em nenhum momento – vive como vivem todos em todo lugar do mundo, à sombra da fama dos “escolhidos”. E o personagem/escritor já cansou disso tudo: parte até para diálogos agressivos com pessoas que acabam sentindo-se enaltecidas por estar discutindo com ele, ainda importante.
O diretor do filme, ao escolher Roma, soube aproveitar-se da variedade da nobreza romana. Parte dela, a chamada aristocracia negra, é proveniente dos descendentes diretos dos papas de séculos atrás, cujos filhos foram beneficiados por condados e principados ainda tão válidos que raramente alguém poderá distinguir quais os de sangue e quais os de batinas. Foi assim que ele pôde abordar no filme o clero que frequenta os grandes jantares badalados, em episódios de valor discutível (o monsenhor que declama suas receitas culinárias nos jantares tão disputados para os quais se alugam convidados com sobrenomes nobres) e com personagens quase surrealistas (uma missionaria decrépita que arremata presenças e doações para longinquas caridades). A presença, a participação e o comportamento do clero faz a "aceitabilidade" de todo o resto. É quase uma perpetua absolvição. E claro,  isto só teria razão de ser em Roma., apêndice - ou o contrário do Vaticano.
É aí que entra a grande razão de ser do filme. O que acontece no filme, as festas, os bailes, as traições, as mentiras, não tem muito importância. O que importa é insuflar, sugerir que o mundo inteiro, hoje, vive à sombra da fama de outros. E não acontece só em Roma. Poderia ser em Londres (onde ainda há muitos nobres, nem tão decaídos) e em Nova Yorque ou em São Paulo onde tudo aquilo também acontece entre os Vips de diversas origens: atores, atrizes, gente de grandes fortunas, suspeitas e não, de grande projeção financeira. Os nobres de lá são os famosos daqui, socialites e colunáveis, os artistas globais, as glamourosas descendentes dos bigbrothers, os grande ricaços que vez ou outra estão à beira da falência, gente que circula nas revistas e nos noticiários. E que, afinal, tem uma aura tão pouco nobre que qualquer pessoa mediana pode imaginar de alcançar o mesmo tipo de vida.
Vi gente sair do cinema no meio da projeção. Compreensível: pois a veemência da crítica foi tão disfarçada pela superficialidade aparente de vida que foi difícil para muitos achar o caminho da verdade.







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